Licenciamento Ambiental da UHE Castanheira
No dia 18/3/24 a Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (SEMA-MT) publicou o arquivamento do licenciamento ambiental da Usina Hidrelétrica Castanheira. A decisão encerra um processo que se estendia desde 2012, e causa apreensão no setor elétrico.
A UHE Castanheira foi um dos empreendimentos hidrelétricos selecionados para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2) e mais recentemente para o Plano de Parcerias e Investimentos (PPI), como um projeto energético prioritário, mantido pelo Governo federal. O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da hidrelétrica foi elaborado a partir das diretrizes emitidas pela SEMA-MT em 2012 e foi entregue para análise da Secretaria em 2015. O desenvolvimento do EIA, foi realizado, de forma integrada, com os estudos de viabilidade técnica e econômica, que são os estudos de engenharia que dimensionam o projeto de uma hidrelétrica, avalia sua viabilidade técnica e econômica e considera as questões socioambientais para melhorias no projeto, para que seja levado a um leilão de energia. O EIA também foi realizado de forma integrada com os estudos específicos exigidos no âmbito do licenciamento ambiental, como a avaliação do potencial malarígeno, a avaliação do potencial arqueológico e o estudo do componente indígena (ECI), que subsidiaram as manifestações da Secretaria de Estado de Saúde (SVS), do Iphan e da Funai, respectivamente. De acordo com a documentação constante no processo de licenciamento da UHE Castanheira, não consta emissão de parecer técnico sobre o EIA pela SEMA-MT, enquanto a SVS, o Iphan e a Funai se mostraram favoráveis ao prosseguimento do licenciamento ambiental da hidrelétrica.
Cabe destacar que mais recentemente a Funai voltou atrás em sua decisão recomendando o não prosseguimento do processo de licenciamento ambiental da UHE Castanheira. Entre os impactos deste tipo de decisão está a insegurança jurídica em processos de licenciamento ambiental.
A UHE Castanheira
O projeto da UHE Castanheira está localizado no rio Arinos, no Estado de Mato Grosso, possui potência instalada de 140 MW e reservatório de 94,7 km² abrangendo os municípios de Juara e Novo Horizonte do Norte. A hidrelétrica não interfere diretamente em Unidades de Conservação, ou Terras Indígenas, nem em áreas urbanas dos municípios.
Decisão pela UHE Castanheira
No Brasil, considerando todos os estudos e etapas necessários para sua viabilização, o planejamento e construção de uma hidrelétrica leva cerca de 10 anos. Isso quer dizer que não se decide fazer uma usina de uma hora para outra, nem se toma essa decisão sem a adequada avaliação dos custos envolvidos, das alternativas do projeto, dos impactos provocados e dos benefícios gerados. No caso da UHE Castanheira, o tempo de estudos e licenciamento ambiental já soma 18 anos, sendo 11 anos dedicados à obtenção da licença prévia.
A EPE iniciou os primeiros estudos da hidrelétrica em 2006, com o Estudo de Inventário Hidrelétrico da Bacia do Rio Juruena que foi aprovado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) em 2010, e identificou 22 aproveitamentos hidrelétricos somando uma potência de 8.831 MW. Além do Estudo de Inventário, foi desenvolvida a Avaliação Ambiental Integrada (AAI) que avaliou os impactos socioambientais do conjunto de usinas hidrelétricas previstas para a bacia hidrográfica do rio Juruena. Dentre os 22 aproveitamentos indicados pelo Estudo de Inventário, a UHE Castanheira foi selecionada pelo Governo federal para prosseguir para a próxima etapa, ou seja, os Estudos de Viabilidade Técnica Econômica e Ambiental (EVTE) e iniciar o processo de licenciamento ambiental para obtenção da licença prévia.
O licenciamento ambiental da UHE Castanheira
A Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Mato Grosso (SEMA-MT) emitiu, em 2012, o Termo de Referência (TR) que orienta a realização do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para a obtenção da Licença Prévia. Os Estudos foram iniciados em 2013, seguindo as orientações e normativas dos órgãos intervenientes e do órgão ambiental licenciador, no caso, a SEMA-MT. O EIA foi entregue na SEMA-MT em 2015, enquanto o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) foi entregue em 2017 após incorporação dos resultados do Estudo do Componente Indígena (ECI). Em 2017 a EPE requereu a licença prévia (LP) da UHE Castanheira.
Sobre os estudos associados exigidos no licenciamento ambiental, foram elaborados a avaliação do potencial de ocorrência de malária, a avaliação do potencial arqueológico e o ECI para subsidiar as análises dos órgãos intervenientes, a saber: a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), o Instituto do Patrimônio Histórico e Arqueológico Nacional (Iphan) e a Fundação Nacional do Índio (Funai).
Seguindo os procedimentos de licenciamento ambiental, a SEMA-MT publicou no Diário Oficial do Estado (DOE) a composição da equipe multidisciplinar para análise do EIA e a convocação para as audiências públicas a serem realizadas em março de 2018, porém os eventos foram cancelados um dia antes. Novas datas foram acordadas, e a SEMA-MT publicou no DOE que as Audiências ocorreriam em dezembro de 2018, porém, mais uma vez foram canceladas, apesar dos apelos e esforços da EPE de que o órgão licenciador mantivesse a realização delas. Não consta no processo de licenciamento ambiental evidências da realização da análise técnica do EIA/Rima, pela SEMA-MT.
Em agosto de 2019, a UHE Castanheira foi qualificada no Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República, o que incluiu a Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (SPPI) nas tratativas para andamento do licenciamento ambiental. No início de março de 2020, com o intuito de prestar esclarecimentos sobre o empreendimento, representantes da SPPI, Ministério de Minas e Energia e EPE estiveram em Cuiabá para uma sequência de reuniões envolvendo a Casa Civil e Secretarias do Estado de Mato Grosso, incluindo a SEMA-MT, o Ministério Público Federal, o Ministério Público Estadual e a Prefeitura de Juara representada pelo prefeito e vereadores do município.
Entre os órgãos envolvidos no licenciamento, a SVS, o Iphan e a Funai se manifestaram favoráveis à emissão da licença prévia. Quanto à análise do EIA/Rima pela SEMA-MT, em 2022 a Secretaria designou nova equipe multidisciplinar para análise do EIA/Rima, no entanto não constam no processo parecer técnico da análise técnica do EIA/Rima. A despeito da ausência da análise, a SEMA-MT solicitou a atualização e complementação dos estudos.
Diante do risco elevado de dispêndio de mais recursos sem que se vislumbrasse garantia da SEMA-MT de que o novo Estudo apresentado seria analisado no prazo determinado e com a transparência necessária, a EPE solicitou à Secretaria motivações e detalhamento das solicitações de complementação e atualização do EIA. Em fevereiro de 2024 a SEMA-MT arquivou o processo de licenciamento da UHE Castanheira.
O Estudo de Impacto Ambiental
Para elaboração do EIA e estudos associados a EPE contratou, em 2013, os serviços especializados do Consórcio Habtec Mott MacDonald – Novaterra Geoprocessamento. Para o ECI foi contratada, em 2015, a MRS Estudos Ambientais. Ambos por meio de licitação pública.
Os estudos ambientais da UHE Castanheira exigiram trabalhos de campo e de escritório e foram desenvolvidos por equipes de especialistas em diversas áreas de conhecimento. Essas equipes identificaram e analisaram as modificações ambientais e sociais que aconteceriam com a implantação da hidrelétrica e formularam programas ambientais e sociais para amenizar os impactos negativos e garantir que os benefícios fossem distribuídos da melhor forma possível por toda a região.
Importante destacar que o EIA traz em detalhe os impactos esperados da instalação da hidrelétrica sobre a fauna e a flora, sobre os recursos pesqueiros, sobre as propriedades e suas atividades econômicas, sobre a economia dos municípios envolvendo arrecadação de impostos e geração de emprego e renda, entre inúmeros outros impactos (Conheça o Rima da UHE Castanheira). Igualmente importante é informar que para cada impacto identificado foram propostos um ou mais programas para reduzir ou compensar tais impactos, sendo este um compromisso irredutível da empresa vencedora do futuro leilão de energia e responsável por construir e operar a hidrelétrica.
O Plano de Comunicação e Relacionamento
Durante a elaboração do EIA, entre 2013 e 2015, foi desenvolvido o Plano de Comunicação e Relacionamento com a sociedade (PCR), que previu uma série de ações de divulgação de informações sobre a hidrelétrica e sobre os estudos socioambientais, e de diálogo com a sociedade civil e poder público local. Entre as principais atividades do PCR destacam-se a criação do site da hidrelétrica www.uhecastanheira.com.br, duas reuniões abertas ao público nos municípios de Juara, Novo Horizonte do Norte e Porto dos Gaúchos, reuniões com grupos focais, e 15 oficinas participativas nos três municípios para construção do Diagnóstico Participativo que mapeou as potencialidades e as fragilidades de cada município e identificou visões de futuro para a região.
O PCR também apoiou as atividades de divulgação do cadastro socioeconômico dos atingidos pela hidrelétrica, divulgação das reuniões públicas, e mobilização para as Audiências Públicas (que foram canceladas pelo órgão licenciador), que envolveram cartazes, faixas, anúncios em rádio, TV e carros de som.
O ECI também previu um Plano de Diálogo com as comunidades indígenas das Terras Indígenas Erikpatsa, Japuíra e Apiaká-Kayabi, que iniciou em 2015 com o pedido de autorização, para a Funai e indígenas, para realização do Estudo e foi concluído com a apresentação dos resultados para os indígenas em 2022.
Além de informar e esclarecer dúvidas da população, a EPE colaborou em diversos momentos com o Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado de Mato Grosso, no âmbito dos inquéritos civil sobre o licenciamento ambiental da UHE Castanheira, primando pela transparência e eficiência no fornecimento das informações solicitadas.
Todo o processo de licenciamento ambiental da UHE Castanheira certamente continuará a gerar debates e reflexões sobre o papel das instituições públicas e da sociedade no planejamento energético nacional e na tomada de decisões que afetam a produção de energia elétrica, a segurança energética do país, a geração de empregos e o bem-estar da população.